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A arte no propósito divino

A arte no propósito divino

1322 990 Aliança Evangélica Portuguesa

O meu nome é Vânia Magalhães e sou formada na área das artes plásticas e banda desenhada/ilustração.

Um convite

Em Novembro de 2019, recebi um convite inesperado de uma amiga para ir até à Guiné-Bissau, com a missão de pintar um mural, numa escola de uma aldeia missionária, construída pelo projeto missionário Semeadores de Alegria, da família Paulo e Jéssica Durão que atuam na Guiné-Bissau, com o foco de trabalhar com crianças e com um projeto de construção de uma aldeia missionária, da qual fazem parte uma escola, centro de saúde, recursos e infra-estruturas. No seu coração está este desejo de amar como Cristo: semeando paz, esperança e alegria.

Na verdade, essa minha amiga já tinha praticamente tudo planeado para ir até lá com a filha, para darem formação na área do ensino e havia também o tal mural para pintar, tarefa que inicialmente pensaram em fazê-lo.

Um dia ao cruzar-se comigo, essa minha amiga pensou: “A Vânia é que era boa para pintar”, e pronto, assim surgiu o convite. Eu nunca tinha tido o sonho missionário africano, mas depois de alguma hesitação, aceitei.

Um passo de fé

Nesse tempo, eu era voluntária na equipa do Desafio Jovem (Operação Josué) e por isso não tinha recursos para poder financiar a viagem, os materiais e outros recursos. E logo aí foi um passo de fé, mas como Deus deseja que primeiro coloquemos o pé, para que Ele coloque o chão, assim foi: a minha amiga teve a ideia de criar um fundo de doações para me suportar na viagem e esse foi o primeiro dos milagres que Deus tinha reservado.

Um anónimo decidiu doar um valor muito alto e que acabou por financiar praticamente quase toda a viagem, em conjunto com a generosidade de tantas outras pessoas a quem Deus despertou o coração. E lá fomos. Eu tinha o desejo de fazer algo grande e excelente, porque não é todos os dias que temos a oportunidade de pintar na Guiné!

Depois de aterrarmos e de termos tido um tempo de descanso, viajámos até à aldeia missionária e lá ficámos quase uma semana. A vida na aldeia é de um despojamento total, apesar dos missionários terem feito (e continuarem a fazer) um excelente trabalho no investimento de infraestruturas e recursos. Por conta disso, nós acabámos por ficar num alojamento lá na aldeia com muitas condições – eu gostaria de ter tido uma experiência mais radical, de ter mergulhado mais na cultura e no estilo de vida guineense mas, quem sabe, fica para uma próxima oportunidade!

Pintar um mural

Foram quatro dias a pintar em horário alargado: as pausas eram para comer e repousar e depois pincéis a funcionar! Acabei por fazer um mural muito maior do que o que tinha planeado, e ainda conseguimos fazer mais uma pequena pintura numa outra parede: foi realmente um projeto muito ousado para o tempo que tínhamos para o realizar, mas não podia ter sido de outra forma.

Das coisas que mais me marcaram, foi a capacidade de deslumbramento daqueles jovens e crianças que ficavam horas pendurados nas janelas da sala onde eu pintava, simplesmente para acompanhar o processo da pintura.

Muitas vezes, era já noite e eu com os holofotes ligados a tentar escapar aos mosquitos, e as crianças lá fora a observar cada traço do pincel, cada mistura de cor, num deslumbramento puro e genuíno. De cada vez, que surgia uma criança que ainda não tinha vindo espreitar, ouviam-se sons de encantamento e espanto que são universais em qualquer língua do mundo.

Desafiou-me a pensar que deste lado do mundo, no nosso mundo ocidental e tão evoluído, cada vez menos temos o desejo ou a capacidade de nos deslumbrarmos até com as coisas mais simples. O que ainda nos deslumbra?

Servir com a arte

Eu vivia um pouco desconetada do meu talento de pintar e desenhar, porque em mim sempre existiu o desejo de servir a Deus, porém eu achava que servir a Deus através da Arte era uma espécie de “serviço menor”. Servir a Deus devia ser com a Medicina, com a missão, com o evangelismo mas não com a Arte. Como é que a Arte poderia mudar vidas? Como poderia trazer esperança a um mundo caótico?

A experiência da Guiné acabou por me reconciliar com este talento e enquadrá-lo com o Reino de Deus. Hoje entendo que a Arte tem um propósito divino muito claro: ser a manifestação do Belo, da Beleza, ou seja, marcar em beleza um mundo caído e desfigurado da imagem de Deus e do seu projeto original.

Apesar da criação estar cada vez mais longe do Seu Criador e o mesmo ter acontecido com a Arte, que cada vez mais se tem afastado do Primeiro Artista – transformando-se em subversiva, mas desprovida do Belo – a criação carece da Arte, para recuperar e pontuar a sua Beleza.

Então, a Arte que revela a Beleza do Criador e ressalta a Beleza da criação tem um propósito e uma missão divina, tão necessária como qualquer outra expressão de serviço. Hoje, isso é algo que está apaziguado no meu entendimento.

Deus de milagres

Para além da pintura, tive ainda o privilégio de poder participar de um culto na aldeia missionária, onde os momentos de louvor até hoje ecoam nos meus ouvidos. Como é possível um tempo de adoração composto única e exclusivamente de vozes e palmas conseguir penetrar tão profundamente o nosso coração? Creio que a simplicidade do louvor, mas o desejo profundo de louvar, cativam o coração do nosso Deus.

Ainda nesse culto tive o privilégio de pregar e de repente não sabia bem o que havia de falar.  Como partilhar o Evangelho naquela realidade? O que Jesus ensinaria naquele contexto?

Do púlpito, recordei a mulher da hemorragia interna, que mais do que um milagre no corpo, experimentou um milagre no seu coração, com a convicção profunda que Deus continua empenhado a fazer milagres em corações humanos, independentemente do lugar do mundo em que nos encontremos.

Vânia Magalhães

Licenciada em BD/Ilustração e Mestre em Artes Plásticas

Cooperadora no Desafio Jovem Portugal.

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