O Tráfico de Seres Humanos é um crime público e não acontece apenas em outros países e continentes. Todos ouvimos as últimas notícias sobre as condições dos imigrantes em Portugal, no Alentejo. A verdade é que já anteriormente, eram divulgadas notícias pontuais sobre este problema. E, de facto, os dados recolhidos pelo Observatório de Tráfico de Seres Humanos, indicam que a exploração laboral representou 70% do total das vítimas confirmadas entre 2008 e 2019. Numa década, registaram-se 547 vítimas deste tipo de Tráfico de Seres Humanos, a maioria, homens.
Consta que o número de imigrantes no distrito de Beja poderá chegar aos 20.000.
Muitos chegarão a Portugal, trazidos pelos contratadores de mão-de-obra temporária, com vistos turísticos, e depois ficam de forma ilegal na região. A apanha dos frutos vermelhos nas estufas localizadas na zona litoral do concelho de Odemira, os olivais e amendoais nos concelhos de Beja e Ferreira do Alentejo, absorvem a grande maioria da mão-de-obra do distrito: quase doze mil trabalhadores (Jornal de Notícias 3-5-2021).
Alguns destes trabalhadores vindos da Ásia relatam que pagam cerca de 10.000€ para virem para a Europa (incluindo Portugal). Vivem em casas, que, por vezes, chegam a albergar 30 pessoas, podendo até ter de dividir a cama com outra pessoa.
Ao que sabemos, foi uma (ou mais) destas situações de aglomerado de trabalhadores sem condições condignas, que gerou um surto de Covid19 em Odemira e que levou a cercas sanitárias no concelho, despoletando a investigação das Autoridades Portuguesas sobre as condições dos trabalhadores no local.
No geral, estes imigrantes fogem à pobreza, e encontram exploração e completa negação dos seus direitos. Auxílio à imigração ilegal, exploração laboral e tráfico de seres humanos são crimes muito próximos e igualmente graves, sendo que ao último deles acresce a perda total de liberdade das pessoas, já que os traficantes ficam frequentemente com os seus documentos, e ainda os ameaçam ou às suas famílias, caso tentem fugir, alegando que têm um dívida para com eles, pela “ajuda” prestada a transitar desde o país de origem até ao país de destino, e/ou a encontrar trabalho.
Depois de Odemira, já outros locais com grande número de imigrantes a trabalhar na agricultura, habitualmente em estufas, tentam amenizar ou revelar as condições dos trabalhadores, de forma a que o mesmo tipo de problema não se repita (falamos por exemplo de Pegões e Albufeira).
Perante tais acontecimentos, a Aliança Evangélica Portuguesa reitera a afirmação já anteriormente proferida, de veemente condenação dos crimes de Tráfico de Seres Humanos. Estes crimes atentam contra a liberdade como um direito fundamental de todos os seres humanos, direito esse consagrado na Declaração Universal dos Direitos do Homem. A reprovação deste crime hediondo foi, também, desde logo, instituída por Deus, quando entregou a Sua Lei ao Seu povo, e está registada nos livros de Êxodo e Deuteronómio.
O Tráfico de Seres Humanos, como todos os crimes, deve ser tratado pelas entidades competentes, mas não nos isenta da responsabilidade de sinalizar e denunciar quando dele temos suspeita ou conhecimento, ainda que o devamos fazer de forma cautelosa e conforme aconselhado pelas autoridades.
Desta forma, no seguimento do que aqui foi exposto, e no intuito de sermos parte integrante do combate e prevenção deste flagelo, é importante ter em conta algumas recomendações que, sempre que possível, devemos colocar em prática. Assim, a Aliança Evangélica Portuguesa apresenta à comunidade evangélica portuguesa e aos demais cidadãos, algumas sugestões, gerais e específicas, para sermos agentes ativos contra o Tráfico de Seres Humanos. Portanto, todos devemos:
- Aprender sobre o fenómeno do tráfico de seres humanos e saber como identificar as vítimas.
- Saber o Número de Emergência em Portugal e denunciar alguma situação suspeita – 144 (número de emergência social 24h/dia).
- Ser um consumidor informado. Conhecer as empresas e os produtos que poderão resultar de uma produção com recurso a tráfico de seres humanos.
- Ser voluntário(a) em projetos anti tráfico na comunidade.
- Tentar perceber, junto das autoridades locais, que ações estão em curso relativamente a este problema.
- Estar informados sobre notícias e acontecimentos relacionados com o tema.
- Organizar eventos de sensibilização sobre o TSH: ver um documentário, entender o que podemos fazer para combater este crime, designadamente analisando a nossa cadeia de consumo. Verificar se na nossa biblioteca local existe, pelo menos, um livro sobre o tema e, se não, diligenciar nesse sentido.
- Organizar eventos de angariação de fundos para ajudar uma instituição que faça prevenção ou resgate/ apoie as vítimas.
- Encorajar as escolas/ agrupamentos de escolas para inserirem a prevenção do TSH nos seus currículos da disciplina de Cidadania/ Educação Moral e Religiosa.
- Usar as redes sociais para prevenir/ sensibilizar sobre o tráfico de seres humanos.
- Verificar se o local de trabalho onde estamos está preparado para identificar vítimas de tráfico de seres humanos.
- Na medida das possibilidades de cada um, ser mentor/ acompanhar alguma criança/ jovem sem suporte familiar. Os traficantes geralmente procuram as pessoas mais vulneráveis nas suas estratégias de recrutamento.
- Pais e cuidadores: falem com os vossos filhos sobre este tema, para os alertar dos perigos e cuidados que devem ter, designadamente nas redes sociais, jogos online, abordagem por desconhecidos, etc.
- Jovens: Aprendam a reconhecer as táticas de recrutamento dos traficantes: sedução online, ofertas de trabalho/formação no estrangeiro, muito promissoras, etc.
- Comunidades de fé (igrejas): poderão organizar sessões de sensibilização adequadas às diferentes faixas etárias. Incluir a prevenção do TSH nos currículos da Escola Dominical e Ministérios Juvenis.
Empresários: Se tem uma empresa e pode oferecer emprego, formação, etc., pode desta forma ajudar uma possível vítima ou impedir que alguém caia numa rede de tráfico, por falta de oportunidades laborais condignas.
Estudantes universitários: organizem ações de sensibilização ou façam investigação/ trabalhos de pesquisa sobre o TSH.
Aos profissionais de saúde: realização de formação para identificar sinais de TSH, priorizar cuidados para as vítimas.
Jornalistas: realização de reportagens sobre o tema e o resgate de vítimas.
Advogados: concedam ajuda, se possível, em regime probono, na defesa das vítimas e condenação dos traficantes. Apoiem na legalização, documentação de imigrantes, etc.
Pela Palavra de Deus somos alertados a erguer a nossa voz pelos que não podem fazê-lo (Provérbios 31:8-9). Por isso, sensibilizamos a comunidade evangélica a mobilizar-se contra o Tráfico de Seres Humanos. A vida humana não tem preço, e cada ser humano é precioso aos olhos do Criador. Cremos que Deus deseja que cada um seja livre e viva em pleno os seus direitos na sociedade, com paz e condições de vida dignas e em igualdade para todos.
Elsa Pereira, Assessora AEP