Já lhe aconteceu, alguma vez, fazer uma pergunta sem esperar ou desejar uma resposta? Sim, pode parecer estranho. Habitualmente, se perguntamos é porque precisamos de uma resposta. Contudo, nem sempre assim é. E, de facto, ao folhear a Bíblia, encontro duas perguntas feitas em momentos diferentes a pessoas diferentes e que têm essa particularidade curiosa: não foram feitas para ser respondidas, mas para despertar uma reflexão imediata e indicar caminho. Servem para chamar a atenção para a urgência do momento e a necessidade de agir rapidamente.
Duas perguntas
A primeira acontece em casa de Jacó, já numa fase avançada da sua vida. O ambiente está tenso pois existe uma necessidade grande por suprir. Há uma falta extrema de alimento, fome. E a pergunta salta dos lábios de Jacó para os seus filhos: “Por que estais olhando uns para os outros?” (Génesis 42:1) Sem esperar que respondam, ele prossegue: “Eis que tenho ouvido que há mantimentos no Egito; descei para lá, e comprai-nos dali, para que vivamos e não morramos.” (Génesis 42:2)
A segunda acontece ao ar livre, junto ao Mar Vermelho, num momento dramático em que povo hebreu precisa de o atravessar e ser livre, e o exército egípcio vem a caminho para impedir. Deus pergunta a Moisés: “Porque clamas a Mim?” E acrescenta, de imediato: “Dize aos filhos de Israel que marchem.” (Êxodo 14:15).
Em ambas as circunstâncias há que agir rapidamente. Não é tempo de “olhar uns para os outros” nem sequer de clamar a Deus. É altura de avançar!
Dar o salto
Já todas experienciámos momentos desses na nossa vida, em que foi premente decidir e passar à acção. Nessa altura, sentimos coragem e força para o fazer? Ou ficámos tolhidas pela incerteza e mesmo por algum medo e não ousámos correr?
A propósito disto, vem-me à mente uma curiosidade acerca da impala. É um animal elegante que vive em manadas nas savanas africanas. Li que consegue correr à velocidade de 90 km/h e dar saltos de cerca de 3 metros de altura, possuidor de uma boa audição e de reflexos rápidos. Contudo, apesar dessa extrema agilidade, num Jardim Zoológico a impala pode ficar num espaço rodeado de um muro de apenas 1 metro e meio de altura e não sairá de lá. Embora tenha em si toda a capacidade para o saltar, e fugir rapidamente, não o fará. Porquê? Porque só salta em circunstâncias em que consiga ver onde é que irá ter.
Por vezes, no nosso percurso de vida, surgem momentos em que é premente agir, dar o salto! Essa é a maior urgência de todas. Mas não devemos ainda orar? Se já orámos e entendemos a direcção por onde Deus nos quer levar, por onde precisamos de ir, avançar pode ser agora a nossa primeira necessidade. Contudo, todos temos um pouco de “impala” em nós. Onde irei ter, com este salto? Onde é que os meus pés irão tocar? O que irá acontecer? A prudência assim nos aconselha. Se devemos ponderar bem sobre a decisão a tomar, avaliar as circunstâncias e os benefícios de o fazer ou não, por outro lado devemos também contar com a ajuda de Deus em cada passo que dermos. Ele mesmo nos promete: “Instruir-te-ei, e ensinar-te-ei o caminho que deves seguir; guiar-te-ei com os meus olhos.” Salmos 32:8
Os filhos de Jacó foram ao Egito e aí não só encontraram alimento mas tiveram uma emotiva reconciliação familiar e iniciaram uma nova etapa na vida.
O povo de Israel atravessou o Mar Vermelho e ficou definitivamente livre do jugo egípcio.
Mãos que nos pegam
Numa noite difícil, Ló sabe que é altura de tomar uma decisão mas parece não conseguir. Deus enviou mensageiros a sua casa que o avisaram que deve abandonar rapidamente a cidade onde vive. Sodoma irá ser destruída no dia seguinte e, nessa mesma noite, ele deve deixar a sua casa, juntamente com a esposa e as suas duas filhas. “E ao amanhecer os anjos apertaram com Ló, dizendo: Levanta-te, toma tua mulher e tuas duas filhas que aqui estão, para que não pereças na injustiça desta cidade. Ele, porém, demorava-se…” (Génesis 19:15,16)
Na verdade, Ló nunca chega a assumir a decisão. Contudo, a sua vida é salva porque “aqueles homens lhe pegaram pela mão, e pela mão de sua mulher e de suas duas filhas, sendo-lhe o Senhor misericordioso, e tiraram-no, e puseram-no fora da cidade.” (Génesis 19:16) Sim, foi preciso pegar-lhes nas mãos e levá-los dali.
Já todas vivemos tempo suficiente para entender que no nosso percurso devida deparamo-nos, aqui e ali, com encruzilhadas e decisões a tomar. Sim, são momentos de “dar o salto”, assumir um novo caminho, mudar de direcção talvez. A visão sobre o futuro é limitada e a perguntas borbulham em nós: Onde irei chegar? Como irá ser? Estarei a fazer a melhor escolha?
Deus sabe que assim é. Ele conhece bem a nossa fragilidade e os nossos pensamentos, que não são tão elevados quanto os Seus. Assim, fiquemos atentas à direcção de Deus sobre a nossa vida, sobremodo importante nestas alturas. Ele fala e faz-nos sentir a Sua vontade. Se Ele confirmar, irá ser connosco e pegar nas nossas mãos se necessário! Busquemos a Deus de coração e guardemos connosco as palavras seguras do salmista: “Porque contigo entrei pelo meio de um esquadrão e com o meu Deus saltei uma muralha.” (Salmo 18:29)
Bertina Coias Tomé
Psicóloga, Especialista em Psicologia Clínica e da Saúde e em Psicologia Comunitária.