Ontem foi um dia de muita introspeção. É assim, há 12 anos a esta parte. Sim, fez 12 anos!
Em 2006, eu tinha a minha vida organizada. Sou professora há mais de duas décadas e, na altura, conseguia sempre colocação perto de casa. Tínhamos comprado um apartamento num 3º andar na Marinha Grande, eu tinha uma bebé, a nossa vida tinha estabilizado e parecia que não iria sair dali. Porém, nesse ano, houve mudanças na Lei que rege o Concurso Nacional de Professores e, contrariamente a tudo o que esperava, fui colocada na escola onde estava efetiva, em S. João da Madeira. Na altura, foi devastador! Eu teria que ir e deixar para trás a minha família. Não poderia levar a minha bebé pois não tinha qualquer rede de suporte, então ela ficou com o pai na Marinha Grande. Ia para S. João da Madeira todas as terças feiras bem cedo e regressava às sextas feiras à tarde. Durante meses, aguentei a distância, porém com um preço muito alto. Cada vez mais sentia o impacto da minha ausência na minha filha e em mim própria. O cansaço, o desânimo e a tristeza constante por estar longe de quem mais amava começavam a pesar…
Até que, numa manhã de segunda feira, a 30 de janeiro de 2007, adormeci ao volante na autoestrada, bati no separador central e depois enfaixei-me debaixo de um camião. Fiquei encarcerada e desmaiei. Entretanto, soube que o carro começara a arder. Tentaram socorrer-me e, nesse momento, por coincidência, passou um carro dos bombeiros com meios para apagar o incêndio e desencarcerar-me da viatura.
Parti os tornozelos, esmaguei o perónio da perna esquerda e fiquei impossibilitada de andar. Além disso, fiz um traumatismo craniano… O ano e meio que se seguiu foi de cirurgias, no início, e fisioterapia, 80 sessões. Ao fim desse tempo, ainda coxeava e manifestava stress pós-traumático que me impedia de conduzir. Ao fim de dois anos e meio, nova cirurgia para remover próteses e parafusos… Durante todo esse tempo, o meu marido tinha que me carregar ao colo três andares para poder entrar e sair de casa e cuidar de mim e da minha filha.
Mais uma vez celebrei a segunda oportunidade que Deus me deu. Eu e a minha mãe lembrámo-nos e ela, como sempre, telefonou para dizer “Parabéns pelos 12 anos de segunda oportunidade!” Deus não só esteve comigo naquele acidente, salvando-me a vida e providenciando os meios para que eu fosse resgatada do carro, mas esteve sempre comigo durante os meses que se seguiram, que foram dolorosos e exigentes, não só para mim como também para a minha família.
Celebro a vida e celebro o Deus que está connosco nos bons e nos maus momentos, que continua a brindar-nos com a sua Presença, provisão e favor. Porque Ele cuida de cada uma de nós e não se afasta, quando percorremos o “nosso vale da sombra da morte”. É aí que a sua Presença nos protege e Ele manifesta a sua fidelidade.
E, enquanto celebro, em silêncio, a “segunda vida” que Deus me deu e que decidi agarrar com unhas e dentes, concluo que as mazelas que ficaram para a vida toda nunca serão capazes de me tirar o sorriso… porque gosto tanto de sorrir!!!
Mais uma vez agradeço a todos os que há 12 anos viveram comigo, durante 1 ano e meio, a fase mais negra da minha vida… Em visitas, em abraços, em telefonemas, em orações, em mimos, em esperança… Nunca esquecerei! Obrigada, amigos! Obrigada, meu Deus!

Ana Isabel Santos Canito
Professora