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A contribuição única da mulher, conforme os propósitos de Deus

A contribuição única da mulher, conforme os propósitos de Deus

450 678 Aliança Evangélica Portuguesa

Concordo com o psicólogo Paul Tournier, quando afirma, no livro “A Missão da Mulher”, que as interpretações da Bíblia feitas durante séculos exclusivamente por homens, a partir de uma perspectiva patriarcal, contribuíram para restringir a mulher ao espaço da casa. Mas Cristo não deu margem para esta discriminação. Pelo contrário, abriu espaços novos para as mulheres a ponto de dar-lhes o privilégio de anunciar a sua ressurreição. No episódio da mulher acusada de adultério, ele convidou o homem a mudar seu olhar sobre ela, percebendo suas próprias falhas e trocando a exigência de seus direitos segundo a lei, pelo reconhecimento de seus deveres para com ela segundo o plano de Deus. Em Cristo, somos chamados a resgatar o projeto original de parceria entre o homem e a mulher.

O alijamento da mulher gerou um mundo muito desenvolvido tecnologicamente, em detrimento das relações interpessoais e da qualidade de vida. Vivemos num mundo à beira de um colapso, com os recursos naturais ameaçados de esgotamento e as relações humanas frágeis e descartáveis. Mas a condição da mulher mudou. As mulheres têm acesso a quase todos os espaços públicos. Elas provaram sua competência profissional e alcançaram todos os escalões da sociedade. Tournier convoca, então, a mulher a ocupar o seu lugar, não se comportando como os homens, mas reequilibrando o mundo com sua afetividade e prioridade para os relacionamentos. Porém esta proposta mantem a dicotomia: o homem pensa e a mulher sente. Por isto, escrevi “O Resgate do Feminino: a força da sensibilidade e ternura em homens e mulheres” propondo que ambos deem lugar ao coração. Pois o machismo amputou os homens de sua sensibilidade. Mas o movimento feminista, que no início buscou acertadamente igualdade de direitos com os homens, acabou priorizando a carreira profissional, promovendo atitudes competitivas e gerando mulheres masculinizadas. Se antes elas não tinham a escolha de trabalhar fora, hoje elas são constrangidas a fazê-lo para contribuir ao sustento da família e serem valorizadas pela sociedade.   

O mundo está à beira do colapso porque o princípio feminino, do afeto, da sensibilidade, da ternura, da compaixão, foi censurado nos homens e negligenciado pelas mulheres. Assim, a missão continua sendo de reumanizar o mundo e reequilibrar nossa sociedade pela prioridade das pessoas sobre as coisas. Mas afetividade e intuição, atribuídas socialmente à mulher, estão em todo ser humano, já que fomos criados à imagem de um Deus cuja essência é o amor e que nos criou com a mesma capacidade. E Cristo é o modelo para homens e mulheres. Ele se permitiu chorar, expressar seus medos, expor sua fragilidade, sem deixar de ser uma pessoa determinada, firme, ousada.   Reconciliar-se com Deus e tornar-se discípula de Cristo é abrir mão do poder e, em troca, tornar-se apta a amar e servir, uma proposta na contramão da sociedade.

As mulheres precisam se libertar das imagens estereotipadas impostas pelo machismo e pelo feminismo para encontrar sua verdadeira identidade, não em papeis, mas na sua essência. Uma característica do feminino é seu anseio por intimidade e pessoalidade. O princípio feminino tem por função acompanhar o ser humano num caminho de interioridade, na descoberta de seu espaço interior, onde ele pode encontrar-se consigo e com Deus, deixar-se amar e compartilhar este amor.

Outra característica importante é a capacidade de ouvir a Deus e o seu próprio coração, que permite desenvolver uma maior intimidade, pois Deus se revela para quem se aproxima com reverência e humildade. Diante de um Deus que me acolhe como sou, posso baixar as armas, reconhecer a minha fragilidade e me perceber amada incondicionalmente. Não preciso mais das identidades artificiais impostas pela sociedade e baseadas no que tenho e faço, na aparência, nos títulos e diplomas, no desempenho e nos recursos materiais.

A mulher, pela sua biologia, tem predisposição para acolher e proteger a vida. Este acolhimento se amplia no exercício da hospitalidade e de uma receptividade que gera trocas transformadoras. Em vez de mendigar afeto e reconhecimento, ela transborda de amor quando se deixa suprir pelo Pai. Sabendo de onde vem e para onde pode voltar, ela pode amar desinteressadamente e servir, conforme o exemplo de Jesus. Em contato com suas emoções, ela é capaz de se identificar com a alegria ou dor do outro. Seus sentidos são vivificados, de forma a ver, ouvir, tocar, saborear e sentir com o coração. Torna-se fecunda e criativa, não apenas através da maternidade biológica, mas desenvolvendo uma maternidade espiritual que a leva a cuidar de si, do outro e da natureza com doçura e delicadeza. Esta sensibilidade não a impede, pelo contrário a fortalece para encarar a vida e a morte, pois quem evita o sofrimento acaba se privando da alegria. O homem constrói UTI, mas é a mulher, como Tereza de Calcutá, que acompanha os moribundos ou como Elisabeth Kübler-Ross, que estuda as fases do fim da vida.

A mulher é convocada a exercer a sua cidadania conforme os valores do Reino para construir uma sociedade mais fraterna, mais justa, inclusiva e sustentável, priorizando qualidade de vida, simplicidade, despojamento, generosidade e gratidão, características daqueles que se sabem ricos do amor do Pai. É a coerência de vida que nos torna agentes efetivos de mudanças culturais, sociais e políticas. Como protagonista e empreendedora, ela contribui na preservação da vida e na construção de relações interpessoais fundamentadas no respeito e compromisso. Consciente dos dons e talentos que Deus lhe confiou, ela pode contribuir para construir uma parceria fecunda com os homens, sinalizando assim a aliança que Deus estabeleceu conosco e a missão de cuidar da Sua criação até que Ele volte.

Isabelle Ludovico

esposa do pastor Osmar Ludovico. Mãe e avó. Economista e psicóloga clínica com especialização em Terapia Familiar Sistêmica. isabelle@ludovicosilva.com.br

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