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31 De Março De 2019 – Dia Da Memória Das Vítimas Da Inquisição – 1ª Comemoração

31 De Março De 2019 – Dia Da Memória Das Vítimas Da Inquisição – 1ª Comemoração

1280 720 Aliança Evangélica Portuguesa

“Podem [judeus e muçulmanos] receber o carácter mas não a essência do sacramento. Todos os intelectuais, e eu, o mais ignorante de todos, apresentei muitas autoridades e princípios jurídicos [para justificar] que não podiam ser obrigados a receber o cristianismo. Este quer e exige liberdade e não violência, e ainda que esta não tenha sido precisa, isto é, com punhais apontados ao peito, foi claramente violência.”

Fernando Coutinho, bispo de Lamego, contra o batismo forçado dos judeus em 1497

 

“E se alguns aí há que são ainda estrangeiros na nossa fé e se consentem, devemos imaginar que se faz ventura com tão santo zelo, que Deus é disso muito servido; e parece mais justa virtude aos servos de Deus e seus pregadores animar a estes e confessá-los e provocá-los, que escandalizá-los e corrê-los, por contentar a desvairada opinião do vulgo (…), porque à primeira pregação, os cristãos-novos desapareceram e andavam morrendo de temor da gente, e eu fiz esta diligência e logo ao sábado seguinte seguiram todolos pregadores esta minha tenção.”

Carta de Gil Vicente a D. João III, a propósito do terramoto de 1531 (atribuído aos judeus)

 

“Com a pregação dos Apóstolos desapareceram os ídolos, nem houve mister que eles os lançassem à fogueira, mas todo o seu empenho era imbuir na fé cristã os ânimos do povo. A ninguém expulsaram do próprio domicílio. Com que proveito expulsamos os judeus de Espanha? Para entregar ao fogo os falsos cristãos e deixar viver em África os restantes. Quanto melhor não seria tê-los conservado no estado de servidão, que no estado de liberdade ter queimado a tantos?”

Nicolau Clenardo, professor do Cardeal D. Henrique, “Carta a João Petit, de 4/12/1540”

 

“Isto, porém, não foi feito por causa da lei nem por causa da religião. Porque assim? Serás capaz de obrigar os espíritos rebeldes e em nada ligados à religião recebida a acreditar naquilo que recusam e rejeitam com extrema energia? Poderás impedir a liberdade da vontade e pôr a ferros os espíritos desenfreados? Isto nem pode fazer-se nem é aprovado pelo poder santíssimo de Cristo.”

Jerónimo Osório, bispo de Silves, contra o batismo forçado dos judeus, in De Rebus Emmanuelis Lusitaniae, 1571

 

“Em Portugal todos têm a boca fechada com mil temores e respeito da Inquisição, como porque os inquisidores não dão ouvidos a nenhum requerimento ou proposta e se fecham com a sua soberania e potência, sem admitirem alguma razão, nem de cristãos-velhos nem de cristãos-novos (…)

Todas as cousas novas se vão fazendo velhas com o tempo; aqui vemos totalmente o contrário, porque quem de uma vez teve a reputação de cristão-novo, por mais tempo que passe, todos os seus descendentes foram sempre cristãos-novos (…) e ficam cristãos-novos para sempre.”

Padre António Vieira, “Memorial a favor da gente de nação hebreia (…)”, 1674

 

“O sexto e último meio para se extinguir em Portugal o nome de cristão-novo, seria darem aos judeus a liberdade de viverem a sua religião, como se pratica em todas as nações da Europa (…), sem embargo de serem tão cristãos com a nossa liberdade, digo, que de duas maneiras se lhe pode acordar, dando-lhe dois guitos [guetos], um em Lisboa, outro no Porto, da mesma maneira que o têm em Roma, com a obrigação de trazer um chapéu amarelo, para serem conhecidos, de que resultaria que todos os cristãos-novos, que verdadeiramente fossem judeus, ou o poriam ou entrariam nos guitos, sem ser necessário que se lhe falasse em perdão geral, nem a Inquisição intentasse mais prender algum cristão-novo; pois é certo que não será judeu oculto, o que puder ser declarado (…)”

Luís da Cunha, Testamento Político (…), 1747

 

“Temos visto que depois da introdução da Inquisição e das inquirições, juntamente com os perdões gerais, que não somente não se extinguiram os Cristãos novos, mas que se aumentou muito mais o seu número, e que a distinção e diferença de Cristão novo e de Cristão velho veio mais notória e mais distinta do que fora nos princípios, logo que os filhos dos Judeus foram baptizados por força”.

(…) Os Santos Apóstolos e todos os Santos Padres da primitiva Igreja foram todos Judeus. Se hoje há X. N.s [Cristãos-novos] que vivem na Crença Judaica, a educação é a causa e não o Sangue, porque todo é vermelho (…)”

Ribeiro Sanches, Origem da denominação de Cristão-velho e Cristão-novo em Portugal, 1748

 

“Os judeus são traquejados, encarcerados e, de lhes confiscarem bens e fazenda, queimados sem misericórdia.

(…) Portugal só será um país próspero e progressivo quando abolir de vez o tribunal do Santo Ofício. Antes, não. Além disso, nada feito, enquanto, no mesmo lugar onde hoje se acha o Palácio da Inquisição, não puderem plantar os judeus a Sinagoga.”

Francisco Xavier de Oliveira, Amusement Periodique, 1751

 

“Não pude deixar de fazer as assíduas indagações para investigar e descobrir a causa com que nos meus Reinos e Domínios se introduziu e fez grafar a dita distinção de Cristãos Novos e Cristãos Velhos, que por aquele longo período de tempo tem infamado e oprimido um tão grande número dos Meus fiéis Vassalos. Lhes prometemos e Nos praz que daqui em diante não faremos contra eles nenhuma Ordenação, nem defesa, como sobre Gente distinta e apartada; mas assim nos praz que em tudo sejam havidos, favorecidos e tratados como próprios Cristãos Velhos, sem deles serem distintos e apartados em cousa alguma.”

Carta de Lei de 25 de Maio de 1773

 

“A causa do Judaísmo oculto em Portugal e Castela foi a ordem de expulsão dos Judeus e conversão forçada dos que cá ficaram. E isto se deve ao Édito de D. Manuel e ao seu zelo indiscreto e mal entendido cristã e politicamente falando. Portanto sendo as leis e o Estado a causa deste Judaísmo oculto deviam os Judeus ser mais brandamente tratados.

(…) O tolerantismo civil é um direito Majestático que todos reconhecem e que os nossos reis puseram em prática ao permitir sinagogas e mesquitas.”

Pascoal José de Melo Freire dos Reis, projeto de reforma Regimento da Inquisição de 1774

 

“As Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, considerando que a existência do Tribunal da Inquisição é incompatível com os princípios adoptados nas bases da Constituição, decretam o seguinte:

1.º – O Conselho Geral do Santo Ofício, as Inquisições, os Juízos do Fisco e todas as suas dependências, ficam abolidas no Reino de Portugal.”

Decreto de 31 de Março de 1821

 

“Forcejámos para que fossem mais os documentos do que nós quem falasse: também cremos tê-lo obtido. (…) Na verdade, uma ou outra vez, o espectáculo da suprema depravação humana, impondo silêncio à voz tranquila da razão histórica, impeliu-nos a traduzir num brado de indignação as repugnâncias irreflexivas da consciência irritada. Mas este senão, se é senão, nunca poderá evitá-lo inteiramente o historiador que conservar os sentimentos do homem e tiver que estudar à luz dos documentos, infinitamente mais sinceros que os analistas, um ou diversos períodos da história do século XVI, daquele século corrupto e feroz (…)”.

Alexandre Herculano, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, 1859

 

“Era o sentimento cristão, na sua expressão viva e humana, não formal e ininteligente: a caridade e a tolerância tinham um lugar mais alto do que a teologia dogmática. Essa tolerância pelos mouros e judeus, raças infelizes e tão meritórias, será sempre uma das glórias do sentimento cristão da Península Ibérica da Idade Média.

(…) Com a Inquisição, um terror invisível paira sobre a sociedade: a hipocrisia torna-se um vício nacional e necessário; a delação é uma virtude religiosa; a expulsão dos judeus e moiros empobrece as duas nações, paralisa o comércio e a indústria, e dá um golpe mortal na agricultura em todo o sul de Espanha; a perseguição dos cristãos-novos faz desaparecer os capitais (…)”

Antero de Quental, Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, 1871

 

“Art.º 8º- É livre o culto público de qualquer religião nas casas para isso escolhidas ou destinadas pelos respectivos crentes, e que poderão sempre tomar forma exterior de templo; mas, no interesse da ordem pública e da liberdade e segurança dos cidadãos, uma lei especial fixará as condições do seu exercício.”

Constituição da República, 21 de Agosto de 1911

 

“Além da vantagem que deve resultar para a província de Angola, a proposta de lei representa um acto de justiça e de reparação para com uma raça que em todos os tempos tão perseguida tem sido e cuja expulsão em massa, em Dezembro de 1496, do território de Portugal, por D Manuel I e depois de 1532 por D. João III, pela ação maléfica da Inquisição, o trágico morticínio nas ruas e praças de Lisboa em Abril de 1506, constituem as nódoas mais negras de toda a história pátria. Esse êxodo dos israelitas, que foram levar as suas riquezas e actividades para a Bélgica, Holanda, Itália e Grécia, e outros países foi uma das causas principais da nossa decadência a partir do reinado de D. Manuel I.”

Senador Nunes da Mata, a favor da criação de um Lar judaico em Angola, Diário do Senado da República, 1 de maio de 1913

 

“A frase tantas vezes editada de que cada país tem os judeus que merece, não se ajusta, ousamos já dizê-lo, a Portugal que teve os judeus de que não era digno nem merecedor – porque o homem de nação, o marrano, era o que de melhor havia entre a nossa gente, e a esse escol inteligente, activo e culto espezinhamos-lhe a consciência na mais revoltante das violências, atirámo-lo execrandamente ao degredo, ao cárcere e à fogueira (…)”

Ricardo Jorge, “Pró-Israel”, in Samuel Schwarz, Os Cristãos-Novos em Portugal no Século XX, 1925

 

“Em nome de Portugal, quero pedir perdão aos judeus das perseguições que foram vítimas na nossa terra.”

Mário Soares, Presidente da República, 17 de março de 1989

 

“1- Saudar a aproximação de povos, culturas e civilizações que o fundo de apreço recíproco entre o Povo Judeu e o Povo Português salvaguardou através dos séculos, ultrapassando os agravos causados pelo Édito de 5 de Dezembro de 1496;

2- Saudar a decisão dos Constituintes de 1820, revogando o Édito, e abrindo à sociedade portuguesa os caminhos da liberdade e da tolerância religiosa, tão gravemente postas em causa pelo Édito e, após ele, pela Inquisição.”

Assembleia da República, 5 de Dezembro de 1996

 

“A alegada fatalidade cronológica pela qual a Inquisição teria apenas usado das armas próprias de seu tempo, cede diante da existência, no mesmo período, de ideias de que derivaram factos históricos opostos. Era só escolher entre o bem e o mal, independentemente de qualquer fanatismo. Porventura, quando D. Manuel decretou a expulsão dos judeus do Reino, não se opuseram a ela energicamente várias personalidades do seu próprio tempo? E, quando ordenou a extinção de todas as sinagogas do Reino em nome da unidade cristã, porventura o próprio Papa, no mesmo período, não consentia que os judeus praticassem a sua fé nas casas de oração dos Estados pontifícios? (…) E, finalmente, não convivem também em nosso tempo a razão e o fanatismo?”

Elias Lipiner, Os Baptizados em Pé (…), 1998

 

“Senhor, Deus de todos os homens, em determinadas épocas da história os cristãos cederam a métodos de intolerância e não seguiram o grande mandamento do amor, deturpando assim o rosto da Igreja, tua esposa. Tem misericórdia dos teus filhos pecadores e acolhe o nosso propósito de procurar a promoção a verdade na doçura da caridade, sabendo que a verdade não se impõe a não ser em virtude da própria verdade”.

Papa João Paulo II, 12/3/2000

 

“Este centro histórico de Lisboa, onde hoje fraternalmente nos abraçamos, foi no passado palco de violências intoleráveis contra o povo hebreu. Nem devemos esquecer, neste lugar, a triste sorte dos «cristãos novos»: as pressões para se converterem, os motins, as suspeitas, as delações, os processos temíveis da Inquisição.

Como comunidade maioritária nesta cidade, há perto de mil anos, a Igreja Católica reconhece profundamente manchada a sua memória por esses gestos e palavras, tantas vezes praticados em seu nome, indignos da pessoa humana e do Evangelho que ela anuncia.”

José Policarpo, Cardeal Patriarca de Lisboa, 26/11/2000

 

“O presente diploma vem permitir o exercício do direito ao retorno dos descendentes judeus sefarditas de origem portuguesa que o desejem, mediante a aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização, e sua integração na comunidade nacional, com os inerentes direitos e obrigações.”

Decreto-Lei de 27 de fevereiro de 2015

 

Após condenar o antissemitismo, no Memorial do Holocausto, em Israel, disse: “O meu próprio país também o viveu. Recordo o momento mais trágico de todos: a expulsão dos judeus no início do século XVI.”

António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas,  28 de agosto de 2017

 

“Em suma, o que vem peticionado a esta Assembleia da República não traduz qualquer vontade de promover a abertura de feridas antigas ou um desejo de acicatar animosidade contra qualquer instituição, secular ou religiosa, antes se enquadra num movimento claro, sério e reconciliador, em que Estado e Igreja já têm dado os passos de reconhecimento dos erros do passado, e encetado a sua reparação pela valorização da memória das vítimas e pela prevenção da repetição dos crimes do passado.”

Relatório da aprovação da petição pelo Dia da Memória das Vítimas da Inquisição,
Palácio de S. Bento, 4 de Dezembro de 2018

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